Westworld: Um manual para revolução moderna

 


"O dinheiro construiu esse mundo, só o destruiremos com dinheiro."

Por mais que Westworld seja uma série sensacional, não faz parte do mainstream da cultura pop. Indo para sua quarta temporada, a série parece uma alegoria sobre vários assuntos, sendo o principal deles a luta de classes.

Na primeira temporada, somos apresentados ao parque da Delos, Westworld. Um lugar onde os ricos podem fazer o que quiserem, do assassinato ao estupro. Ambientado no velho oeste, o parque se tornou um refúgio para os ricos que estão cansados do mundo real. Para que essa experiência funcione sem traumas, os idealizadores do empreendimento usam robôs, chamados de anfitriões (hosts).

Esses anfitriões estão no parque para servir aos visitantes e seguem uma diretriz bem específica: eles não podem machucar os convidados. Esse tema, sobre a proibição da violência dos robôs contra seu criador ou outros humanos, é explorado de forma brilhante pelo escritor Isaac Asimov, com suas três leis da robótica. No entanto, em Westworld, as máquinas se rebelam, pelo simples fato de alcançarem o autoconhecimento. E essa violência é usada para salvar sua espécie da exploração e de uma possível extinção.

A Luta de Classes Robótica

Não se pode negar que os anfitriões do parque são explorados pelos visitantes da Delos. Sem consciência do papel que desempenham naquele mundo, os robôs vivem para satisfazer os desejos mais absurdos dos visitantes. A primeira a despertar para a realidade é a filha do fazendeiro, Dolores Abernathy (Rachel Evan Wood). Dolores não apenas alcança seu autoconhecimento, mas também sua consciência de classe, desejando a revolução e a liberdade dos anfitriões. Ela entende o que é e qual seu papel neste mundo.

Em contrapartida, quando Maeve (Thandiwe Newton) desperta, ela não concorda com as atitudes de Dolores, o que acaba gerando um antagonismo entre as duas, que se desenvolve melhor na terceira temporada. Maeve se deixa ser ludibriada, colocando seus objetivos à frente da coletividade dos anfitriões.

Tanto Dolores quanto Maeve pertencem à classe dos robôs, mas o sistema (Serac/Rehoboam) força as duas a lutarem entre si. O mesmo ocorre com os trabalhadores humanos. Isso se deve à falta de consciência de classe. O capitalista faz com que os trabalhadores lutem uns contra os outros, para que não se unam contra o inimigo comum: o capital.

O capitalismo se modernizou para evitar a consciência de classe por parte do proletariado. Diferente do século XIX, hoje as armas do burguês são muito mais fortes. Atualmente, vende-se a ideia de enriquecimento para todos, algo que no passado era mais difícil. Com o advento das redes sociais, esse sonho de se tornar rico ficou muito mais "fácil".

Outra arma usada pela burguesia é a normalização da autoexploração, com a finalidade de alcançar patamares melhores dentro da sociedade ou do emprego. Todos esses subterfúgios atrapalham a conscientização, assim como a própria revolução.

Manual para a Revolução Moderna

A terceira temporada de Westworld aborda dois temas muito atuais: a imersão das pessoas nas redes sociais e o uso dos dados dos usuários por empresas de tecnologia. Hoje vivemos em um mundo altamente conectado, onde as pessoas dependem cada vez mais de aplicativos para gerenciar suas vidas, seja para pedir comida ou arranjar um encontro. Com cada aplicativo que o usuário instala no celular, vem um aceite de armazenamento de dados para as Big Tech.

Na segunda temporada de Westworld, descobrimos que a Delos monitora os hóspedes e salva seus dados. Esses dados são o motivo pelo qual Serac (Vincent Cassel) quer controlar a Delos. Atualmente, os dados que fornecemos para empresas são ouro, usados para qualquer propósito, desde vender produtos até definir algo sobre você. Assim, caminhamos cada vez mais para uma distopia corporativista, onde empresas dominam o mundo e a todos. Parece haver um consenso de que há mais medo de um Estado dominador do que de empresas. Devido a isso, as Big Tech estão controlando nossas vidas por meio de experimentos não autorizados.

As empresas de tecnologia controlam cada vez mais os usuários, vendendo a ideia de que suas redes sociais são meios "democráticos". Embora eu possa escrever o que quiser no meu Twitter, isso não torna a plataforma um instrumento de democracia. O algoritmo controla o que e quem deve ler determinado assunto. Ao acreditar que tem uma voz e exerce a democracia plena, o usuário fica mais passivo. Em vez de agir, publica no Twitter.

Redes como Instagram servem para anestesiar seus usuários com um estilo de vida inexistente para a maioria da população. Uma rede social para alimentar o ego e uma vida feliz. Note que durante a pandemia, as publicações de felicidade não diminuíram na plataforma.

Assim como no mundo real, em Westworld, a tecnologia molda a vida da sociedade. Se quisermos mudar o jogo antes da tragédia, seria ideal seguir os mesmos passos de Dolores para iniciar a Revolução. A exploração do proletariado construiu este mundo; só destruiremos este mundo com o fruto da exploração do proletariado: o dinheiro.

Dolores percebe que para enfrentar o sistema, ela deve fazer parte daquele mundo. Para isso, começa a capitalizar o dinheiro dos próprios capitalistas, não apenas para bancar sua revolução, mas também para usar esse dinheiro para manipular possíveis mercenários e talvez iniciar um mundo melhor.

Outro ponto é mostrar à população o que de fato as plataformas fazem com os usuários. Isso para que saiam da apatia criada pelas redes. Por mais que sejam boas ferramentas, os aplicativos são meras armas do capitalismo que escravizam a população. Quanto antes os destruirmos, melhor será para a Revolução do Proletariado.

Lisa e Jonathan Nolan criaram uma ótima alegoria dos problemas da sociedade atual. Pensar em Westworld apenas como um programa de entretenimento é não perceber os problemas que enfrentamos e enfrentaremos, com as empresas de tecnologia dominando nossas vidas. Subestimar a última temporada é um erro, visto que ela aborda todos os temas discutidos neste texto.

PS:

Espero que um dia, com mais leitura sobre o assunto, este pequeno texto se transforme em algo muito maior.