O Mensageiro | Crítica

O Mensageiro: A Tentativa de Retratar os Horrores da Ditadura Militar


Entre 1964 e 1985, o Brasil viveu um dos períodos mais sombrios de sua história recente: a ditadura militar, que ceifou milhares de vidas e deixou uma profunda cicatriz não apenas no país, mas também nas inúmeras pessoas e famílias que sofreram durante esses anos. Decidir fazer um filme sobre esse momento pode, ao mesmo tempo, reabrir feridas e manter viva a memória dos horrores ocorridos nesses 21 anos.

É com essa temática que a diretora Lúcia Murat apresenta seu novo longa, "O Mensageiro", que está em cartaz nos cinemas. O filme conta com um elenco de peso, incluindo Valentina Herszage, Shi Menegat, Floriano Peixoto, Georgette Fadel e Higor Campagnaro.

    A trama gira em torno de Vera, uma jovem presa em uma fortaleza militar durante a ditadura, em 1969. Durante sua prisão, ela conhece um soldado, Armando, que, movido pelo sentimento de culpa, decide levar uma mensagem para a família de Vera. A partir desse gesto, surge uma relação afetiva entre Armando e Dona Maria, mãe de Vera. O filme explora a possibilidade de diálogo entre duas pessoas solitárias e perdidas: uma senhora de alta classe média e um jovem de origem rural, do Sul, que veio servir ao Exército. Nos dias atuais, Vera, agora aos 70 anos, é professora universitária e debate com seus alunos temas como política, perdão e as ideias de Hannah Arendt.

    Retratar um momento tão significativo como esse é uma tarefa desafiadora, e, infelizmente, Lúcia Murat não consegue causar o impacto necessário com seu filme. Acompanhamos Vera (Valentina Herszage), uma jovem que é presa em uma prisão militar em 1969 e que, após ser torturada pelos militares, recebe a ajuda de seu carcereiro. Embora saibamos dos horrores que muitos sofreram nas mãos dos militares, incluindo torturas cruéis e até a morte, Murat não consegue transmitir esse sentimento de forma a nos fazer realmente nos importar com Vera. A personagem é apresentada ao público logo após uma sessão de tortura, sem que tenhamos informações suficientes para criar uma conexão emocional com ela. Esse vínculo ausente torna difícil para o espectador sentir empatia apenas porque ela foi torturada, o que acaba sendo uma solução fácil e ineficaz.


    Outro ponto problemático é o personagem de Shi Menegat, Armando (Shi Menegat). A relação que ele desenvolve com Vera não é bem explicada ao longo da trama, e a obsessão e o remorso que o consomem não são devidamente explorados devido a falhas na edição. Muitos dos conflitos psicológicos de Armando permanecem no subtexto, o que prejudica a compreensão do personagem.

    Esses problemas no filme podem ter uma explicação plausível: o que estamos vendo não é realmente um longa-metragem, mas uma série editada para ser lançada como filme. Esta parece ser a única justificativa para as lacunas na narrativa e o desenvolvimento superficial dos personagens. O mesmo problema ocorreu com o filme "Ninguém Sai Vivo Daqui", que estreou no mês passado nos cinemas brasileiros. Originalmente concebido como uma série para o GloboPlay, o material foi cortado e reeditado para se tornar um filme, resultando em uma execução insatisfatória. "O Mensageiro" pode ter sofrido do mesmo mal, com muitas brechas na história de Vera, Armando e dos pais de Vera.

    Se essa suspeita for verdadeira, lançar a série no formato de um longa-metragem foi uma estratégia equivocada. O material não está bem editado, deixando vários buracos na narrativa, o que contribui para que o filme não receba a atenção merecida.


Nota: 3/10