Quem não gosta de um bom conto de fadas, especialmente quando ele transforma a vida do protagonista? O clássico moderno Uma Linda Mulher trouxe essa ideia ao contar a história de uma garota de programa que vive uma semana incrível com um cliente, vislumbrando a chance de deixar as ruas e ascender financeiramente e romanticamente. Esse tipo de narrativa é revisitado em Anora, filme dirigido e roteirizado por Sean Baker, vencedor da Palma de Ouro de Melhor Direção no Festival Internacional de Cinema de Cannes 2024.
Na trama, acompanhamos Anora, uma jovem profissional do sexo que trabalha nas noites do Brooklyn e tem a chance de mudar sua vida ao se casar impulsivamente com Ivan, o filho de um oligarca russo. No entanto, seu conto de fadas fica ameaçado quando os pais de Ivan chegam a Nova York determinados a cancelar o casamento. Com um elenco formado por Mikey Madison, Mark Eydelshteyn e Yura Borisov, o filme mistura humor, críticas sociais e desconstrução de estereótipos.
É impossível assistir Anora sem lembrar de Uma Linda Mulher. Porém, enquanto o clássico dos anos 1990 flerta com o romantismo, Baker abraça o humor ácido e uma crítica velada que desafia preconceitos e convenções. O filme não traz inovações na direção, mas conta uma boa história sobre imaturidade, ancorada em atuações cativantes e momentos marcantes.
Mikey Madison, no papel de Anora, entrega uma atuação brilhante. Ela surpreende, especialmente para quem a conheceu em Pânico (2022). Madison incorpora a personagem com maestria, trazendo momentos memoráveis, como a luta na sala de estar, que destaca sua habilidade dramática e cômica. Por outro lado, Mark Eydelshteyn também se destaca como Ivan, retratando um jovem mimado que ilustra bem os filhos de milionários que vivem sem noção do valor das coisas. Sua interpretação dá profundidade a um personagem que toma decisões impulsivas sem considerar as consequências para os outros.
Um dos pontos mais interessantes do filme é como Baker trabalha os estereótipos e os desconstrói. A entrada dos capangas russos, por exemplo, cria a expectativa de um filme violento, com homens perseguindo uma donzela em perigo. Contudo, o que recebemos são cenas de humor e reflexões que quebram essas convenções. Isso é algo que lembra o filme A Acompanhante Perfeita (crítica em breve), que também joga com esses estereótipos antes de desconstruí-los.
Outro tema central de Anora é a imaturidade de Ivan e sua relação com pessoas de classes sociais mais baixas. O personagem busca se cercar de indivíduos que pode dominar, desde empregados a amigos de origem humilde, evitando conviver com seus iguais. Anora, por sua vez, acaba caindo na armadilha do glamour que ele oferece, acreditando ter encontrado uma saída para sua vida. Esse conto de fadas, no entanto, revela-se ilusório, especialmente quando a família de Ivan entra em cena.
Anora é um bom filme, uma trama envolvente que traz de volta um tipo de história que já foi sucesso em Hollywood, mas com um toque de modernidade e reflexão. Ele nos tira do "mais do mesmo" e nos lembra por que ainda gostamos de contos de fadas, mesmo que sejam cheios de reviravoltas inesperadas e críticas à sociedade contemporânea.
Nota:7,5/10