Os Radley – Crítica com Spoiler

    A cultura pop muitas vezes serve como um meio de crítica à sociedade em que está inserida. Seguindo essa linha, estreia hoje, quinta-feira (27), Os Radley, longa baseado na obra homônima de Matt Haig.

    Os Radley são uma família inglesa aparentemente comum – casa organizada, festas no jardim, empregos respeitáveis e participação em clubes do livro. No entanto, por trás dessa fachada perfeita, escondem um segredo obscuro: eles são vampiros. Apenas os pais, Helen e Peter, conhecem sua verdadeira natureza, pois decidiram ser “abstêmios” – vampiros que optam por não beber sangue, mesmo lutando contra seus instintos. Seus filhos adolescentes, Clara e Rowan, desconhecem a verdade. Contudo, tudo muda quando, em uma noite fatídica, Clara é atacada por um colega de classe e seus instintos sanguinários vêm à tona, forçando os pais a finalmente revelar a realidade da família.

    Um ponto interessante do filme dirigido por Euros Lyn (Doctor Who) é sua identidade britânica. Embora isso possa parecer um detalhe menor, faz toda a diferença na condução da narrativa e no humor característico, que se distancia do tom das produções hollywoodianas convencionais.

    Os Radley não pretende inovar dentro do gênero de filmes sobre vampiros, e nem precisa. O longa, protagonizado por Damian Lewis e Kelly Macdonald, utiliza o vampirismo como uma metáfora para temas mais profundos, como vício, repressão, drogas e até mesmo a hipocrisia social. Assim, a originalidade da trama não está na abordagem tradicional dos vampiros, mas na forma como esses temas são trabalhados dentro da narrativa.

    No entanto, o roteiro apresenta algumas fragilidades, principalmente na aceitação da condição vampírica pelos filhos. Clara e Rowan passam a vida sem suspeitar da verdade, mas, após o incidente com Clara, os pais rapidamente revelam o segredo. O problema está na rapidez com que os jovens assimilam essa informação. Não há um choque significativo ou uma crise de identidade; tudo acontece de forma abrupta, comprometendo a verossimilhança da transição.

    O grande mérito do filme está nas suas metáforas. Os Radley seguem um manual semelhante ao de grupos de apoio, como Narcóticos ou Alcoólicos Anônimos, para se manterem “sóbrios” e evitar o consumo de sangue. Rowan, ao descobrir sua verdadeira natureza, tem dificuldades em controlar o desejo pelo sangue, e sua relação com esse impulso remete ao vício em drogas, como heroína ou cocaína. Já Helen, interpretada por Kelly Macdonald, lida com outro tipo de repressão: o desejo sexual reprimido por seu cunhado. Esses elementos adicionam camadas aos personagens e tornam o filme mais denso do que uma simples narrativa sobre vampiros.

Além disso, o roteiro explora a dinâmica do casal, a sexualidade de Rowan, os desejos de Clara e como todas essas questões precisam ser reprimidas para manter as aparências em um subúrbio inglês. Afinal, moradores dessas regiões, independentemente do país, são pressionados a sustentar uma imagem de perfeição – sendo justamente nesses ambientes onde os maiores segredos se escondem.

Os Radley é um filme interessante, mas pode não cativar completamente o público brasileiro. Para aqueles que buscam uma obra de vampiros repleta de sangue e violência, talvez essa não seja a escolha ideal. No entanto, para quem aprecia uma abordagem mais simbólica e reflexiva, o filme pode ser uma agradável surpresa.

Nota: 7/10